Texto: Patrick Guimarães
Produção: Danilo Pires
Truculência, estupidez, voz alta, tentativa de humilhação ao trabalhador, intimidação, indícios de abuso de autoridade… Ficou comum ver secretários e parlamentares chegando a estabelecimentos, dos mais diversos, com tons ameaçadores e suposta (ou imposta) superioridade moral, durante abordagens de fiscalização. Como se fosse uma “fórmula”, o sensacionalismo virou norma, principalmente entre os agentes públicos, que em maioria esmagadora estão inseridos em algum projeto político, seja pessoal ou em nome de alguém. O engajamento sobre um corte (reels) passou a valer muito mais do que bom senso e preparo técnico, assim como a falta de educação e de respeito vigora em tom galopante nos vídeos cuidadosamente editados para circularem nas redes sociais. É curioso notar que “a fórmula” é a mesma utilizada entre todas as nuances políticas. Seja de esquerda, de direita ou de centro, quando o assunto é viralizar e ampliar a popularidade, as posturas se confundem entre si, tornando-os produtos iguais na mesma prateleira.
Um caso recente chama atenção e se enquadra bem nesse conceito de informação sensacionalista e sem compromisso com a realidade, após um vídeo ser publicado pelo secretário municipal de Defesa do Consumidor da Prefeitura do Rio de Janeiro, João Pires.
Demonstrando despreparo sobre o cargo que ocupa, bateu boca com funcionários, fez uma série de acusações sem apresentar provas e tentou diminuir trabalhadores em suas funções, ao sugerir que são “bajuladores de patrão”.
“Você fica pulando na frente do problema dos outros, sendo usado de bucha por dono de posto… Trabalhador defendendo dono de posto”, ironiza o secretário.
Após ter gritado com o funcionário, corrido atrás, chamado a polícia, ter promovido um mini show midiático, no fim do vídeo, o secretário assume ter encontrado apenas “suspeitas”:
“A gente suspeita que algo pode estar acontecendo aqui, mas, infelizmente, por a gente não ter encontrado irregularidades, o flagrante, a gente não pode proceder com a interdição”, finaliza João Pires, com uma musiquinha de lavagem cerebral estrategicamente tocando baixinho ao fundo.
Com o posto ao fundo, sugere ainda que pode estar havendo furto de combustível, apesar de admitir não ter encontrado irregularidades. O constrangimento ao trabalhador foi concretizado, importando apenas a imagem moralista e em busca de assunto e curtidas na internet.
Assista o vídeo abaixo:
No vídeo, João Pires chega intimidando e constrangendo trabalhadores _ CRÉDITO: Reprodução/Internet
Contrato de R$ 27 milhões da Secretaria do Consumidor do Rio levanta suspeitas
A Secretaria de Proteção e Defesa do Consumidor do Rio, chefiada por João Pires, firmou um contrato de R$ 27 milhões com o Instituto Inova Rio para o projeto “Salas do Consumidor Carioca”, com duração de 24 meses. O acordo, assinado em 17 de outubro de 2025, prevê ações de atendimento itinerante e letramento digital.

Uma semana após a assinatura, a secretaria liberou R$ 13,5 milhões, metade do valor total. O alto montante e a proximidade do período eleitoral despertaram críticas da oposição, que vê possível uso político da verba.

O vereador do Rio Fernando Armelau (PL) classificou o contrato como “estranho” e pediu que o TCM-RJ realize uma inspeção extraordinária para apurar a legalidade e o destino dos recursos.
João Pires é apontado como pré-candidato a deputado em 2026 pelo partido do prefeito Eduardo Paes (PSD), e possui relevância estratégica para Paes no município de São Gonçalo, para uma possível disputa ao governo do estado pretendida por Paes.
Abordagens se confundem
Como se utilizassem a base de um mesmo roteiro, os “influencers públicos” abordam funcionários e encarregados, teoricamente mais fáceis de intimidar, e raramente “vão pra dentro” (sic) de quem realmente manda, os patrões, sejam eles da iniciativa privada ou pública.
Em 2023, os deputados estaduais Rodrigo Amorim (União Brasil) e Filippe Poubel (PL) chegaram a ser proibidos pela Justiça do Rio de entrar e gravar nos espaços públicos da UERJ em todo o estado, por constrangimento e intimidação a funcionários.

No vídeo, os deputados com a mesma abordagem, só que no Detran _ CRÉDITO: Reprodução/Internet
* Figura bonecos em destaque criação IA.



