Operação revela: Policiais a serviço do Bicheiro Capitão Guimarães

Operação revela: Policiais a serviço do Bicheiro Capitão Guimarães
Foto: Divulgação/Reprodução
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Uma investigação conjunta conduzida pela Polícia Federal e o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) revelou um complexo esquema de compra de armamento por parte de policiais, operando sob a autorização do Estado, para beneficiar a organização criminosa controladora do jogo do bicho e das máquinas caça-níqueis no Rio de Janeiro. A operação teve início durante a desarticulação da quadrilha liderada por Ailton Guimarães Jorge, mais conhecido como Capitão Guimarães.

Este escandaloso esquema envolveu tanto policiais militares quanto civis, um policial penal e o proprietário de uma loja de armas na Baixada Fluminense. Utilizando suas prerrogativas como agentes de segurança e autorização de suas respectivas instituições ou da própria Polícia Federal, mais de 20 indivíduos vinculados à quadrilha compareceram à loja de armas para adquirir pistolas e carabinas nos anos de 2020 e 2021. O pagamento por essas armas foi, entretanto, realizado pelo grupo liderado por Capitão Guimarães. Esse armamento foi posteriormente empregado na segurança de bicheiros e na escolta de locais de atividades ilegais.

A descoberta desse conluio ocorreu graças à obtenção de arquivos de áudio e vídeo decorrentes da quebra de sigilo telemático do inspetor da Polícia Civil, Alzino Carvalho de Souza, que atualmente se encontra detido sob acusação de liderar a segurança da organização de Guimarães. Um dos elementos-chave da investigação é uma imagem que inclui uma lista manuscrita com 23 nomes de agentes de segurança, entre eles 20 policiais militares, dois policiais civis e um policial penal. Esta lista faz referência à aquisição de 23 pistolas e 22 carabinas (abaixo do nome de um dos agentes consta a observação “só pistola”).

Chama a atenção o fato de que nove dos agentes mencionados nessa lista pertencem ao 12º Batalhão de Polícia Militar (BPM) em Niterói, local onde, conforme a investigação, Capitão Guimarães exerce controle sobre atividades ilegais, como o jogo do bicho. O documento também inclui um cálculo do montante total gasto na compra dessas armas, chegando a R$ 312 mil.

Áudios obtidos do e-mail de Alzino revelam detalhes do esquema e expõem a cumplicidade do proprietário da loja de armas, que tinha conhecimento da origem do dinheiro utilizado nas compras e da função dos agentes como “laranjas” para a quadrilha. Em outubro de 2020, Alzino explicou em um áudio enviado ao empresário que eles estavam realizando uma compra, mas seriam os próprios policiais a comparecerem à loja para efetuá-la. Alzino também mencionou a necessidade de evitar levantar suspeitas dos órgãos de controle das polícias e insinuou que o pagamento seria parcelado como precaução.

As conversas entre Alzino e o dono da loja de armas se estenderam até agosto do ano seguinte, incluindo o envio de fotos das armas ainda em suas embalagens. O MPRJ destaca que, com base nesses diálogos, fica claro que o vendedor estava totalmente ciente da ilegalidade da operação em andamento.

Uma imagem apresentando os números de série de 23 pistolas Taurus modelo TS9, calibre 9mm, foi enviada pelo proprietário da loja ao chefe da segurança de Capitão Guimarães. O MPRJ confrontou esses números com os bancos de dados do Exército e da Polícia Federal, confirmando que 17 dessas armas estavam de fato registradas em nome dos agentes citados por Alzino. As demais armas permaneceram em estoque na loja.

Vale ressaltar que as mudanças nas regulamentações ocorridas durante o governo do então presidente Jair Bolsonaro, antes das compras, permitiram que as armas adquiridas pela quadrilha tivessem um poder de fogo maior. Anteriormente, pistolas e carabinas 9mm eram consideradas armas de calibre restrito e não poderiam ser compradas por agentes de segurança para uso particular. No entanto, um decreto presidencial de 2019 expandiu a lista de calibres de uso permitido. Isso levou Alzino a especular sobre a possibilidade de seus comparsas adquirirem até mesmo fuzis.

Apesar da identificação de parte das armas envolvidas no esquema, elas ainda não foram apreendidas. Com base nessa investigação, Alzino e Capitão Guimarães respondem a acusações de organização criminosa e homicídio. Atualmente, Alzino está sob custódia, enquanto o bicheiro enfrenta o processo em regime domiciliar. A Polícia Militar alega que ainda não foi oficialmente notificada sobre os fatos, mas garante que tomará medidas para apurar o ocorrido assim que receber a notificação. A Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) também afirma não ter sido notificada sobre a investigação. A Polícia Civil esclarece que a aquisição de armas de fogo por policiais civis depende de autorização da Polícia Federal e que já existem processos disciplinares em andamento contra os policiais civis envolvidos.

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